Há tempos, cultivávamos um abacateiro em nossa casa. Cresci vendo seus galhos multiplicarem-se e nos presentear com sua sombra. Eu já não me recordo de quando foi que ele me ultrapassou em altura, nem tão pouco quando se deu a sua primeira florada, mas me lembro que a partir daí jamais deixou de frutificar. Todo ano distribuíamos abacates para a vizinhança. O abacateiro cresceu demais, e como foi plantado muito perto da casa, estava trazendo problemas. Seus galhos debruçavam-se sobre o telhado e quando chovia, o vento os jogavam de um lado para outro, numa dança frenética, com sons que pareciam uivos de lobos. Eu tinha muito medo. No decorrer do tempo, foi cogitado o interesse em cortá-lo por precaução, já que seus galhos atingiriam a rede elétrica. A torcida era para que ele apesar dos problemas continuasse lá, como um marco em nossa família.
Todas estas passagens que me recordo agora me trouxeram a lembrança de meu pai. Quando eu me sentia com muito medo, na hora das tempestades, eu o chamava e o levava até a janela para mostrar a situação do abacateiro. Ele olhava, fazia cara de Super- Homem e como se analisasse o problema, que na verdade era mais assombroso em minha mente do que real, passava a mão nos meus cabelos e me dizia para sossegar meu coração, que não havia perigo algum. Nunca soube ao certo se dentro dele mesmo, talvez houvesse ou não uma pontinha de medo, mas suas palavras traziam a segurança de que eu precisava para relaxar e curtir a beleza da chuva, vendo o barro que salpicava da terra pela força dos pingos e sujava as paredes da casa que logo a chuva lavava e novamente o barro sujava. Ver os caminhos que a água fazia como uma serpente. Correr, pegar folhas de cadernos e construir barquinhos. Vê-los desmanchando-se e, quando eram feitos de revistas, observar as figuras deformando-se até colorir um pouco a água. Contar os clarões dos relâmpagos e esperar o barulho dos trovões. Um pouco mais tarde, sair prá rua e comemorar um novo clarão, dessa vez, o clarão do sol, atraindo borboletas sobre as flores molhadas...
Ele se foi tão cedo! Não mais segurou em suas mãos os meus medos. Eu continuei crescendo, (frágil, porém), sem poder contar com seu abrigo, aquele em que basta um olhar, para saber do pai que a gente tem.